sexta-feira, 23 de março de 2012

impressões da greve de ontem 22 de Março de 2012

Em primeiro lugar, temos de dizer que esta greve de ontem não teve a adesão esperada, e levou a que facto inédito, a CGTP não avançasse com números no final do dia. Esta foi por isso uma greve muito menos participada do que a de Novembro.
E outro dado muito significativo, pela primeira vez, uma importante organização sindical, admitiu que a adesão a esta greve geral ficou aquém do esperado.
É uma revelação extremamente relevante, se tivermos em conta que noutras greves gerais, assistimos a uma ridícula guerra de números entre governo e sindicato, a ponto de uns apontarem o número de 11 % de grevistas, e outros, no caso obviamente o sindicato atirar o número de 95 %.
Naturalmente, o número real esteve bem longe tanto de um valor como de outro.
Ontem, a própria Federação Nacional de Professores, admitiu que muitos foram os docentes que decidiram vir trabalhar.
Claro que, para este atirar da toalha ao chão, houveram alguns bodes expiatórios previsíveis. É o medo de represálias, ou então a precariedade no salário, que faz com que na hora de fazer greve, cada docente pense duas vezes, se se pode ou não dar ao luxo de ficar sem esse dia de trabalho!
Salvo as devidas proporções, isto faz-me lembrar aqueles treinadores que quando perdem um jogo, atiram sempre a culpa para o árbitro, para o relvado, para o tempo que se fazia sentir, ou quem sabe para a alimentação que os jogadores ingeriram antes daquele jogo!
É óbvio que se analisarmos isto de uma forma séria, esta fraca adesão dos professores à greve, não se pode aceitar como válidas as desculpas do sindicalista Mário Nogueira. Pode eventualmente acontecer que em situações muito específicas, estas justificações até se tenham verificado. Mas quando se passa para a generalização, temos dois factos que as destroem pela raiz.
Se os professores têm medo de represálias, que fará muitos profissionais privados que vivem diariamente com o coração nas mãos? Apesar de tudo, a contratação de professores, obedece a critérios generalistas bem definidos, transparentes, que não dependem das preferências pessoais de quem os contrata.
E o argumento económico, esse nem falemos. Se um professor que ganha muito mais do que por exemplo um auxiliar de acção educativa, e que me vem dizer que não faz greve porque o dinheiro lhe faz falta, então esses auxiliares de acção educativa como é que iam fazer greve?
E isto entronca numa questão que merece ser salientada.
Em muitos casos, verificamos que aqueles que fazem greve, são os que ganham menos. Nas escolas, fazem os auxiliares, enquanto os professores não fazem. Nos hospitais, fazem os auxiliares e enfermeiros, enquanto os médicos decidem trabalhar.
Sendo a decisão de fazer ou não fazer greve perfeitamente pessoal e obviamente legítima, não deixa de ser curioso, que aqueles que já de si vivem pior, com salários muito menos favoráveis, sejam os que optam por fazer greve, enquanto os que até podiam fazer porque em condições normais precisam menos do dinheiro do dia de salário, acabam por trabalhar. Muitas vezes até com uma deslealdade absolutamente gritante. Porque percebem antecipadamente que os auxiliares vão fazer greve, e como sabem que sem eles o serviço não se pode desenrolar, acabam por a furar. Isso é aliás, ainda mais perverso porque eles no fundo trabalham mas não trabalham, porque não há condições para o fazer. Logo limitam-se a frequentar o local de trabalho!
Depois, temos também o comportamento altamente deplorável de certos piquetes de greve que falam em democracia, em liberdade, mas que nestas coisas teimam em obrigar a que todos os colegas à força tenham de fazer greve, mesmo que conscientemente eles até queiram trabalhar. Que linda forma de ver a democracia! É aquele tipo de democracia que só é válida quando lhes dá jeito. Quando não dá, vá-se a democracia, venha-se a ditadura.
Por mim, abomino por completo estes radicalismos, que são tanto mais inadmissíveis quanto injustificáveis, porque mesmo que toda a gente fizesse greve, duvido dos resultados práticos de tal medida, uma vez que, para muitas empresas, a greve até é uma coisa boa, porque poupam nos salários e nos gastos correntes, e os prejuízos acabam por ser muito menores do que os ganhos directos.
E já pensaram que em muitos casos, quem está errado é quem faz greve? E ainda se acham no direito de impor à força essa postura errada aos colegas?
Acredito nas boas intenções de muita gente. Mas depois de duas greves gerais em quatro meses, embora esta última convocada apenas por uma central sindical, devia fazer-nos reflectir à cerca dos resultados. E eu penso que eles foram praticamente nulos, e continuamos de greve em greve até à greve final, sem que se consiga nada de palpável.
Não estou a acusar ninguém, limito-me a constatar um facto, que pelo menos deve fazer pensar quem efectivamente está aqui imbuído das melhores intenções, que não tenho dúvida é uma larguíssima maioria.
O pior que podemos ter é a descrença generalizada, e pior ainda é quando eu sinto que no fundo ela já se instalou na nossa sociedade, e tem obrigatoriamente de ser abolida. E se calhar, em vez dos piquetes de greve, daquele forrobodó e das palavras de ordem, há que estar mais atento no dia a dia, e intervir civicamente sempre que necessário, usando para tal todas as formas que estiverem ao nosso alcance.
Esta ideia é muito vaga, mas se for devidamente esmiuçada pode aleijar bem mais do que estas greves que de facto aleijar, só mesmo a carteira de quem decide não trabalhar neste dia!
Para uma luta alternativa, para algo que realmente aleije, eu não me importava de estar uma ou duas semanas a pão e água, mas tinha de ser algo que realmente abalasse a estrutura do país, e fizesse reflectir o nosso poder político. E quando falo de poder político, falo de todos. Porque esta ideia de atirarem responsabilidades uns aos outros não cola. Acho que um dos grandes problemas da nossa sociedade é o paradigma e os lobys instalados, que leva a que a política neste momento não exista. E uma coisa que não existe, já mais pode ser credível. E se calhar o que era preciso fazer, era aproveitar os bons que temos em cada partido, e arrumar com a escumalha que existe em todos os partidos.
Que tal acham da ideia?
Só que para isso, todos nós tínhamos de estar livres de preconceitos, de ideologias partidárias, que normalmente é como as religiões só existem para que muitos se aproveitem dos partidos para se aviarem, e temos de ser livres, analisar sobre tudo factos, ideias e atitudes e nunca pessoas.
Quando pomos as pessoas acima das atitudes e ideias, estamos a subverter por completo a lógica da nossa intervenção cívica.
Como nota final, não posso deixar de condenar veementemente a postura do agente da PSP que agrediu uma profissional da comunicação social.
Os nossos governantes, têm a mania de dizer que as manifestações são legítimas, estão consagradas, bla bla bla. O problema é que na prática, tentam calar os manifestantes com este tipo de artimanhas, o que só lhes fica mal, porque quanto mais calam os manifestantes mais lhes dão força para continuarem o protesto, e assim é que deve de ser.
Desejo que este caso tenha o devido tratamento, para que realmente se comece a perceber que o direito à indignação e à manifestação é mesmo consagrado, e que ninguém tenha dúvida à cerca disso, e pior que ninguém tome atitudes que de certa forma levem à repressão da legítima manifestação de desagrado de qualquer cidadão residente neste país.

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