Abaixo a liberalização do insulto e da anarquia
Compreendo a indignação da generalidade da nossa opinião pública com os últimos incidentes na assembleia da república.
O que não concordo é com o foco das críticas. Assunção Esteves fez o que lhe competia, e os manifestantes deram mais uma machadada nas nossas instituições democráticas.
O problema é que estes não são os manifestantes quaisqueres, são dirigentes sindicais que vulgarizam a casa mãe da democracia, quando eles também comem no mesmo prato. Sim! Porque os sindicatos são igualmente agentes políticos com responsabilidades diferentes dos partidos é certo, mas não deixam de fazer política, que como todos sabemos, norteia toda a actividade sindical, e eles quer se queira quer não, têm responsabilidades políticas, porque não são uma simples organização privada.
Desde logo porque têm acento na concertação social, o que faz deles uns parceiros e uns agentes activos da democracia.
Depois porque os sindicatos têm direitos consagrados na constituição e na lei, o que acho muito bem, eu sou um apologista da actividade sindical, e é precisamente por isso que eu defendo que estas organizações têm de ser responsáveis, saber respeitar as instituições, porque os partidos também são instituições e são obrigados a respeitar os sindicatos.
Imaginem agora se os deputados decidissem invadir um congresso da UGT ou da CGTP e começassem a chamar-lhes a todos reaccionários, comunistas etc?
E o mais ridículo é a forma como muita gente se atirou à Assunção Esteves por ela ter evocado aquela citação do carrasco, porque alegadamente esse pensamento era usado pelos nazis.
Parece que aqui a culpada foi a Presidente da Assembleia da república, e as vitimas são os sindicalistas que estavam ali a manifestar-se e coitadinhos até foram impedidos de continuarem com o barulho.
Afinal o que é que está mal? É desordem ou a tentativa do cumprimento da lei?
E o ponto é mesmo este. A forma gratuita como se vai para a assembleia da república e se insulta indiscriminadamente sem critério, sem respeito sequer pelas pessoas quanto mais pelas instituições, é ilegal, condenável, imoral e absolutamente ilegítima.
Qual a legitimidade de um grupo de pessoas organizadas, sob a capa de uma organização sindical deslocarem-se ao parlamento para provocarem desordem, tumulto e arruaça política?
Qual a legalidade de um grupo de pessoas, mesmo que até nem estivesse organizado interromperem os trabalhos da assembleia da república, debitando mensagens perfeitamente vazias e sem direito ao contraditório?
Já nem discuto as razões, porque se fôssemos por aí, eu digo que nesta fase histórica em que vivemos o drama maior é o desemprego e o trabalho precário. Isso sim comove-me e faz com que eu me levante da cadeira para gritar com todas as minhas forças que este não é o caminho, e ao alimentar esta sociedade laboral estamos a cometer um crime sem perdão.
Não me parece que as reivindicações de muito boa gente que se estava a manifestar naquela Assembleia da república passassem por aí.
São obviamente preocupações legítimas, mas vamos lá ver se nos entendemos. Lutar por manter um estatuto, dando corpo à sociedade hiper corporativista que temos desde à três décadas a esta parte, não é a mesma coisa que reivindicarmos algo que implica praticamente a nossa sobrevivência!
E não me parece que os manifestantes das galerias da Ar estivessem preocupados com o trabalho precário!
Eles estavam a defender única exclusivamente o seu estatuto, o que é absolutamente legítimo obviamente, mas não a li, em plenas galerias da Assembleia da República, nem interrompendo os trabalhos, nem muito menos insultando todos os deputados.
Não sei porque as forças de segurança demoraram tanto tempo a repor a ordem pública.
Sim, porque é de desordem pública que estamos a falar.
Não estou a defender esta classe política que considero globalmente muito má, embora não caia na tentação de os meter todos no mesmo saco, e muito menos aceitar que todos são corruptos.
Mas é preciso dizer algumas verdades.
A primeira é que também não temos feito tudo para que a classe política seja melhor, e mais responsável. Preferimos o facilitismo que é o de achar que eles são todos iguais e por isso afastamo-mos da política, ou então ir para a rua com a bandeira na mão fazer de carneirinho, do que arregaçar as mangas e fazer algo de positivo por este país.
A segunda verdade é que vejo muita gente a encher a boca com a crise, mas se pensarem bem não sentiram crise nenhuma na pele.
Continuam com o mesmo rendimento disponível, foram obviamente prejudicados pela conjuntura, mas verdadeiramente não tiveram de fazer grandes reajustamentos.
aliás, eu penso que a situação do país que já estava mais grave do que muitos imaginarão, obviamente ficou aind pior depois da demissão de Paulo Portas e do início desta crise política.
E temos sinais muito preocupantes, como por exemplo o adiamento do pagamento do subsídio de férias, que se deve em minha opinião à falta de dinheiro na tesouraria do estado, embora o Passos Coelho não possa dizer nada porque obviamente se isso sucedesse, haveria uma corrida generalizada aos bancos, uma fuga de capitais e então sim entrávamos oficial e dramaticamente na banca rota.
Um outro sinal qque nos demonstra aquilo que eu referi anteriormente, é a demissão de Victor Gaspar, que não é nada meiga para o governo, e podemos sempre imaginar que ele deixou de acreditar no seu próprio projecto.
Mas, eu creio que se abandalharmos as nossas posições, se extremarmos as nossas atitudes, apenas pioramos mais a situação.
E a tal terceira e última verdade que vos quero dizer é que o insulto gratuito tem de ser irradicado.
Compreendo o drama das pessoas, todos nós estamos inquietos, ansiosos, preocupadíssimos com o actual estado do nosso país, mas já mais devemos ter a tentação de por um lado apreçar a sua queda nas profundezas do abismo, e por outro liberalizar o insulto, tornando-o banal, corriqueiro, e hás duas por três até os próprios titulares de cargos públicos deixam de lhe dar importância, fazendo mais ou menos aquilo que muito bem faziam os árbitros de futebol à uns anos atraz, quando nos estádios os porcos e os índios iam para os estádios só mesmo para descarregarem a sua fúria e as suas frustrações insultando os árbitros a torto e a direito.
Ainda há bastantes porcos e índios nos estádios, cada vez há menos é verdade, mas espero que não se transfiram para a política, porque a libertinagem e a anarquia nunca resolveram qualquer problema, antes pelo contrário só os agravaram.
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