sexta-feira, 13 de julho de 2012

Não sei se a Licenciatura de Miguel Relvas é legal, mas sei que não é nada ética

Na política, temos a legalidade a que todos estamos sujeitos, mas temos também a ética, que vai muito para além do simples cumprimento da lei.
É por isso que dizemos com razão que não basta ser sério, é preciso parecer.
Há quem diga que a licenciatura de Miguel Relvas está dentro da legalidade, e que a universidade lusófona já atribuiu licenciaturas idênticas a outros clientes, compradores de canudos.
A segunda afirmação é verdadeira. Sabemos que foram 89 os canudos vendidos, mas mesmo assim, segundo palavras do reitor agora demissionário, Miguel Relvas foi aquele que teve direito ao canudo mais rechonchudo, isto é, foi o aluno que beneficiou de mais créditos pelo curriculum apresentado. Inclusive até se fez valer de um cargo de presidente da mesa da assembleia-geral de um rancho folclórico.
Para quem não sabe, esta facilidade advém do tratado de Bolonha, que permite que possa ser atribuída uma licenciatura com base na experiência profissional do candidato mediante a avaliação do curriculum.
Ou seja, o aluno não precisa de fazer a cadeira, porque a universidade decide atribuir uma nota considerando aquilo que o aluno fez na sua vida.
E foi através deste expediente que permitiu a Miguel Relvas fazer num ano, um curso que normalmente demora 3 anos a fazer.
E mais escandaloso ainda, é a quantidade de cadeiras que foram feitas por Miguel Relvas. De 36 cadeiras que o curso contempla, ele apenas fez 4.
Ou seja, de grosso modo, podemos dizer que Miguel Relvas fez apenas 11 % do curso.
Mas as coisas parece que não são assim tão lineares. Numa situação legal, a universidade tem de ter um concelho científico, e deve existir um parecer para cada cadeira devidamente fundamentado. No caso de Miguel Relvas, parece que não houve concelho científico nenhum, nem há qualquer parecer das trinta e duas cadeiras que Relvas fez sem fazer!
Não sei sequer se a licenciatura foi ou não legal, e a investigação deveria ir até às últimas consequências. Mas o que sei é que este caso não é mesmo nada dignificante para a classe política.
Se analisarmos esta questão sob o ponto de vista conceptual, isto é, ser avaliado pela experiência profissional, e receber créditos em função disso, a ideia não é má. Mas como é óbvio, tem de haver uma razoabilidade na forma como se processa este expediente, porque se não há rigor, só aqueles que têm dinheiro, poder e influência podem recorrer a estes canudos artificiais.
E o mais grave é que foi este governo quem pôs em causa o facilitismo do sistema de ensino e condenou à morte as novas oportunidades.
E como é possível que um primeiro-ministro diga que os cidadãos comuns não podem receber equivalência ao décimo segundo através de um processo que fomenta o facilitismo, e que também tem em conta a experiência de vida do aluno, e aceita ter como seu braço direito, alguém que também se licenciou, numa espécie de novas oportunidades dos doutores!
Qual é a diferença?
Miguel Relvas teve um percurso de vida comum a muita gente. Inscreveu-se na JSD, teve oportunidade para entrar no mercado de trabalho, e deixou os estudos. Preferiu a independência financeira ao estudo académico. Nada contra. Aliás isso em minha opinião até é nobre, e é tão válido como se ele decidisse prosseguir com os estudos.
O problema é que O governo não pode defender uma coisa, e ter um ministro com a importância de Relvas que pratique outra completamente diferente.
Ele quis comprar uma licenciatura usando o seu dinheiro, e sobre tudo a sua influência.
E estas práticas sim são nefastas para todo o poder político. E se as pessoas como se vê olham para os políticos com muita desconfiança, estas posturas só ajudam a que esse sentimento se adense ainda mais na opinião pública. E o que nos foi prometido por estes novos ventos que sopraram através deste governo, foi que teríamos um conjunto de ministros normais, que iam apostar na seriedade nas mensagens, nas políticas e na forma de estar, em suma que iam tentar credibilizar os políticos. Efectivamente, Passos Coelho tem dado alguns passos importantes neste sentido, mas enquanto não conseguir convencer Miguel Relvas que hoje ele já é muito mais um problema do que uma solução, convencendo-o assim a sair com dignidade deste governo, Tudo aquilo que Passos Coelho e todos os ministros disserem e fizerem em prole dessa tal seriedade, é manchado pela forma como Miguel Relvas obteve a licenciatura, e também em parte pela forma como ele tem actuado em todas estas polémicas, que é sinceramente muito negativa.

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