As declarações de Passos Coelho sobre o caminho que os desempregados devem fazer
Mesmo considerando a conjuntura extremamente difícil em que vivemos, onde o maior flagelo da nossa sociedade é o desemprego, não concordo nada com esta crítica generalizada que alguns fizeram a Passos Coelho, por este ter dito num encontro de empresários, que o desemprego devia ser uma janela de oportunidades para os portugueses, dizendo ainda que os desempregados deveriam arriscar mais.
As críticas que temos ouvido vão todas no sentido que o Primeiro-ministro insultou os desempregados, e que é fácil dizer-lhes que devem arriscar, quando através das políticas de austeridade, uma grande parte das empresas deixam de ter capacidade para funcionar, e consequentemente disparam os níveis de desemprego.
Não há dúvida que temos de tratar com especial cuidado e respeito os nossos desempregados, e aqui concordo com o próprio ministro das finanças quando afirma que uma pessoa até pode superar mais facilmente a morte de um familiar, do que a perda do seu emprego.
Eu próprio, já tenho criticado inúmeras vezes os actuais governantes.
Mas neste particular, e se virmos a questão sob o ponto de vista teórico, Passos Coelho tem razão, e mais palavra menos palavra, é evidente que quando um trabalhador fica desempregado, o pior que lhe pode acontecer é resignar-se, esperar que as coisas aconteçam, deixar de lutar, e de procurar alternativa.
Da mesma forma que, pegando na comparação que fez o ministro das finanças, apesar de ser duro superar a morte de um familiar, é óbvio que todos nós pedimos que as pessoas façam por continuar a sua vida, porque ela não pode parar por maior que seja a tristeza e o desgosto. Também aí, não percebo a onde existe contradição entre o que diz o Primeiro-Ministro e o Ministro das finanças!
Voltando à questão do emprego, Temos muitos casos de concidadãos que o perdem, e ao desistirem de procurarem novas soluções e de serem activos, acabam por ficar irremediavelmente fora do mercado de trabalho.
E depois já sabemos que se por acaso o país inverter esta tendência recessiva, passando para uma tendência de crescimento, os empregos não vão bater à porta das pessoas. Quem está desempregado tem a obrigação de estar atento, procurar empresas que o possam ajudar, mostrar-se disponível, fazer formações, em suma estar activo. Caso contrário, mesmo que a economia cresça e que surjam mais empregos, os resignados e desistentes vão mesmo perder o comboio.
E sinceramente, parece-me altamente hipócrita andarmos a condenar um líder político que diz estas coisas perfeitamente banais, e que no meu ponto de vista são do senso comum.
Acho que isso não configura falta de respeito pelos desempregados. Cada caso é um caso. Muitos há que de facto tentam e que não conseguem encontrar emprego, mas infelizmente uma franja considerável de desempregados também se acomoda, fica à espera que as coisas aconteçam, e que as oportunidades lhes batam à porta.
Neste país as coisas estão de tal forma, que nenhum agente político pode dizer algo que vá fora do que o politiquez está habituado a ouvir e a ler, que lhe cai em cima um chorrilho de críticas absolutamente extremistas, e que são tremendamente injustas e injustificadas.
É a chamada política dos paninhos quentes, do coitadinho que muitos infelizmente gostam muito de valorizar, em vez de potenciarem as capacidades de cada um, e darem valor ao mérito individual de cada qual.
Fazendo um paralelismo que se enquadra perfeitamente neste caso, seria o mesmo que um de nós ao visitarmos um doente na cama de um hospital, lhe dizermos que ele tem de ter força e que precisa de lutar para voltar à vida activa, e os colegas do lado nos criticarem por alegadamente não estarmos a respeitar a doença que o enfermo está a ser vítima. Seria obviamente uma crítica absolutamente desajustada.
Respeito pelos desempregados sim, mas também devemos ter a audácia para, mesmo em tempo de crise agitarmos as águas, e darmos um safanão na resignação.
Foi aliás isso que fez Mário Soares, que embora seja altamente discutível a ideia em si, trata-se de um sinal político que todos devemos acolher e reflectir nele.
Aliás, até para os partidos da oposição é perfeitamente contra producente estarem a utilizar estas declarações como arma política de arremesso, porque estão a desviar as atenções do essencial, e estão apenas a usar este tipo de sound bites que não trazem nada de novo.
É ridículo que se transforme o debate político à volta destas declarações, fazendo com que uns sejam pró paços Coelho e digam que ele não disse nada de assim tão extraordinariamente grave, e outros sejam anti Paços Coelho, e digam que ele insultou os desempregados.
Eu não sou pró nem anti, agora acho muito mais graves e discutíveis certas medidas que o governo está a pensar implementar, como por exemplo a banalização dos despedimentos, que claramente vai tornar o mercado de trabalho ainda mais selvático, do que estas declarações.
E era isso que eu gostava de ver discutido, e os líderes políticos, todos eles, deveriam deixar estes sound bites, e obrigarem as pessoas a debater estas medidas.
Porque ainda relacionado com o mercado de trabalho, é muito fácil e demagógico, virmos dizer que queremos uma legislação americana, se depois todo o nosso modelo económico está assente em realidades completamente distintas.
Claro que a mim, até me fascina a ideia de em tese, as pessoas poderem mudar de emprego muitas vezes na vida, e de quando não estarem satisfeitas despedirem-se de uma empresa, e na semana seguinte terem logo outra para onde trabalhar. O problema é que a realidade europeia actual não permite isso, e quando um trabalhador é despedido ou se despede, infelizmente a regra não é encontrar logo outro emprego na semana seguinte.
Creio que nos devemos deixar de demagogias e perceber a realidade que temos, colocar as pessoas em primeiro lugar, e só depois os sangue sugas dos mercados e afins. E isto para que futuramente essa escumalha do mundo seja pura e simplesmente irradiada, porque não deixa saudades nenhumas.
Termino só com esta ideia.
É curioso que nunca tivemos tão desenvolvidos como até aqui sob vários níveis, desde o tecnológico até ao social por exemplo, e creio que nunca tivemos tão inseguros, tão preocupados, tão receosos com o tempo que há-de vir, em suma com tanto medo de viver.
E isto deve dar que pensar.
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