O acordo com a concertação social que é bom e mau ao mesmo tempo.
Apesar deste acordo entre o Governo e os parceiros sociais excluindo a CGTP, já ter sido assinado à duas semanas, não há dúvida que ele vai marcar irremediavelmente a vida dos portugueses nos próximos anos.
Admito que ele possa ter alguns aspectos positivos, mas ele é na sua globalidade violentíssimo, e despertou reacções que eu considero chocantes.
Desde logo a excessiva festa que o Primeiro-ministro fez, parece-me perfeitamente desajustada ao contexto de severa austeridade que os trabalhadores vão ser sujeitos.
Mais a mais, estamos perante o pior acordo dos últimos 30 anos, e dizer que é um bom acordo, é o mesmo que insultar a inteligência e a dignidade das pessoas.
Bom só mesmo o facto de uma grande parte dos agentes sociais se terem entendido, e que pelo menos tenham chegado a uma posição de consenso, para ver se os estragos venham a ser os menores possível. Neste aspecto, saúda-se a coragem de João Proença da UGT, que contra a corrente, creio que apesar de tudo contribuiu para que o acordo não fosse ainda pior.
Mas isto não implica que não digamos a verdade toda. E este acordo vai acabar com muitos dos direitos que foram conquistados já em democracia, e vai empobrecer muito o nosso mercado laboral, percarizando muitíssimo a relação trabalhador entidade patronal.
Podemos dizer que países desenvolvidos como por exemplo os Estados Unidos já navegam nestas águas há muito tempo, e as pessoas mudam de emprego como quem muda de camisa.
É um facto que não podemos negar. A questão é que para compararmos esta realidade, não podemos meter no cesto as variantes que nos interessam! Temos de ter em conta todas as nuances, designadamente as oportunidades que um país dá, e que outro não dá. E se nós nem temos economia para segurar os trabalhadores que já estão empregados, quanto mais permitir que as pessoas possam ter a facilidade de circular de empresa para empresa.
Hoje, qualquer pessoa que tenha um emprego minimamente estável, só se for aventureira ou irresponsável, aceita mudar para algo absolutamente inserto.
É preciso dizer isto, para que não nos deixemos embalar no canto da sereia. Não podemos dar estas golpadas no mercado laboral, sem primeiro criar as condições para que a economia floresça, e para que as janela de oportunidades se possa escancarar como noutros países civilizados.
O princípio eu até concordo com ele, o ideal mesmo é que existam oportunidades para que todos nós possamos fazer várias coisas diferentes na nossa vida de trabalhadores. A questão é que se a pessoa trabalha é para a sua subsistência, mesmo que goste muito daquilo que faz, a primeira motivação é essa, e isso é obviamente básico.
E podem também dizer-me que para chegarmos a esta sociedade mais liberal, e onde as pessoas possam ser mais felizes no que fazem profissionalmente, temos de passar por sacrifícios. Mas há sacrifícios e sacrifícios!
Imaginem que demoramos uma década a impulsionar a economia. Vamos ter durante este tempo as pessoas com trabalho precário? Vamos ter durante este tempo pessoas que não sabem se no dia seguinte têm o seu ganha pão ou não? Com que estabilidade se podem encarar projectos de vida, se a questão laboral não está mais ou menos definida? E acham sinceramente que é uma ambição assim tão perversa as pessoas quererem ter um emprego minimamente estável e pensem em construir projectos de futuro para a sua vida?
Acham que é um desejo assim tão hediondo e blasfemo?
Obviamente que a resposta é não!
Eu até concordo com algumas medidas anunciadas. A questão é que este pacote no seu todo é muito negativo, e fica claramente a ideia que aquilo que se pretende é fomentar o trabalho precário, e como todos bem sabemos, se já de si a entidade patronal está em clara vantagem porque tem a faca e o queijo na mão, se retiramos ainda mais direitos aos trabalhadores, daqui a pouco é preciso pagar para trabalhar! Passo a ironia, obviamente.
É que esta ideia de flexibilização laboral, vai quer queiramos quer não contribuir para o aumento dos despedimentos em catadupa. E creiam que isso não é preconceito em relação aos patrões! Aliás, é curioso que até aí o governo mostra ser profundamente incoerente.
E porquê?
Por várias razões, entre as quais uma das medidas que eu acho serem das mais insensíveis e brutas que estão previstas.
A partir daqui uma empresa fica com total liberdade para se ver livre dos funcionários mais antigos, basta extinguirem o posto de trabalho, ou então encontrar formas para levar a que o funcionário seja acusado de inadaptação, o que como sabemos não é nada difícil, tendo em conta a constante evolução tecnológica que felizmente temos assistido.
Claro que eu sou a favor da introdução da tecnologia, e percebo que um colaborador por mais anos de casa que tenha, tem o dever de se adaptar às novas ferramentas, e às novas realidades. O problema é que se houver interesse deliberado em arrumar com os trabalhadores mais antigos, podemos introduzir tecnologias muito menos amigáveis, difíceis de manusear até pelos mais novos, só para que haja o pretexto legal para despedir o trabalhador.
E aqui é verdadeiramente inadmissível e escandaloso que não haja por parte do legislador, a sensibilidade suficiente para perceber que uma coisa é despedir um trabalhador com 35 anos, outra coisa muito diferente é despedir um trabalhador com 50, 55 ou 60.
A onde é que esse ser humano vai encontrar trabalho? Se o subsídio de desemprego pode durar até aos 26 meses apenas, e tendo em conta que a reforma vem apenas aos 65 anos, caso o trabalhador tenha por exemplo 50 ou 55, como é que ele vai sobreviver?
Fica dependente dos filhos? Mas se os filhos são estudantes, ou então recém licenciados e também não têm emprego?
Esta falta de sensibilidade a mim indigna-me porque parece que estamos aqui a falar de animais que a qualquer momento quando deixarem de serem úteis podem ir para o matadouro, servir de carne para canhão.
Mas meus amigos, não estamos! Estamos a falar de pessoas com sentimentos, que têm expectativas, que precisam muitas vezes de acabar de criar os filhos, que trabalharam a vida toda, e só porque a empresa entende que pode vir um trabalhador mais jovem, ganhar menos dinheiro, usufruir de um contrato mais precário e ser obrigado a dar a patinha ao patrão, quer arrumar com o mais velho.
Esta é uma questão dramática, que queima mesmo o risco da calamidade, porque esta sociedade sem esperança no futuro, que não sabe tratar e integrar todos concidadãos sejam eles velhos ou novos, não é sociedade decente, nem muito menos recomendável. Que não se chame a isto civilização, mas sim selvação! É que isto é mesmo uma selvajaria.
E há outra ideia que eu quero deixar. Preconceito, é do legislador, que não protege os trabalhadores mais antigos, porque entende que a antiguidade gera vícios e quebra de produtividade. Se os trabalhadores vierem dizer que os patrões querem é despedir as pessoas, que querem vigarizar os colaboradores levando as empresas a baterem no fundo para se verem livres dos funcionários, acusam-nos de preconceito. Agora quando é o próprio governo que entende que os trabalhadores antigos representam mais um problema do que uma solução, já não é preconceito. Que linda forma de ver as coisas!
Ainda neste sentido, parece-me negativo baixar o valor das indemnizações a pagar em caso de despedimento, dos antigos 30 dias para 20 dias.
Esta medida se fosse isolada até se podia aceitar, a questão é que isto dá indícios de ser um claro assalto e uma liberalização nítida dos despedimentos, tal é a catadupa e a relação de todas estas medidas. E é contra isso que eu me insurjo, contra a falta de segurança no trabalho.
Para não se dizer que tudo é mau, concordo apesar de tudo com o banco de horas. Percebo que em certas actividades os patrões vivam um verdadeiro drama, quando em determinadas alturas não têm encomendas, e noutras têm excedente de encomendas. É preferível fazer com que os colaboradores trabalhem menos quando não há tanto trabalho, e possam trabalhar mais quando o volume de pedidos for maior.
Aqui pode aplicar-se perfeitamente aquele senso comum. Umas vezes dá para as outras! Naturalmente, para o trabalhador isso é sempre negativo, porque uma semana pode trabalhar quatro horas por dia, e nas semanas seguintes pode ter de compensar. No entanto é daqueles sacrifícios que eu, em tempo de crise acho razoáveis, e aqui temos a vantagem de o vencimento do trabalhador ser estável, e para mim este facto é muito, mas mesmo muito relevante. Porque até agora, quando as empresas entravam em lay-off o vencimento dos trabalhadores era afectado grandemente, e com este banco de horas, se se conseguir evitar vários lay-offs, acho que já vale apena esta medida.
Também parece-me francamente desajustado o retirar de tantos dias de descanso, sendo que 3 são de férias, e 3 ou 4 feriados.
Que se retirem os feriados estou de acordo, agora que se retirem as férias, e ainda por cima, fazendo com que a empresa possa guardar dias de férias para pontes, parece-me muito pesado e não se justifica, por quanto isso não vai aumentar a competitividade.
Considero que esta medida de fazer com que a empresa possa obrigar os trabalhadores a gozarem dias de férias em pontes, até é aceitável. Mas era justo então que permanecessem os 25 dias de férias, premiando inclusive aqueles que são mais acídulos. Aliás este facto creio que inclusive até vai funcionar ao contrário, porque eu penso que esses 3 dias de férias a mais que o trabalhador tinha se não faltasse durante o ano eram um bom incentivo para a assiduidade.
Com este conjunto de cortes, imposições e restrições ao nível de férias e feriados, podemos correr o risco de haverem anos em que o trabalhador apenas possa gozar 15 dias úteis de férias à sua vontade. Basta que a conjugação das pontes propicie esse facto. É repito, perfeitamente desajustado, mesmo em tempo de crise aguda como é o caso.
Finalmente percebo e até concordo em parte que quando o trabalhador falte num dia anterior ou posterior a um dia de descanso ou feriado, perca também a retribuição desse dia de descanso.
Esta mania em que uma ponte a meio da semana é pretexto para faltar a semana toda, de facto tem de acabar, isso é verdade.
Sem comentários:
Enviar um comentário