sexta-feira, 7 de julho de 2017

apresentação do livro a bíblia ou Jesus do Padre Mário de Oliveira

Na passada Sexta Feira 07 de Julho de 2017, tive a honra de apresentar o mais recente livro do meu querido amigo Padre Mário de Oliveira, a bíblia ou Jesus. Esta apresentação decorreu na biblioteca Lúcio Craveiro da Silva, e partilho aqui o texto que escrevi de propósito para esta apresentação. É com uma enorme alegria que estou aqui a partilhar convosco umas palavras acerca da Bíblia ou Jesus?, do meu querido amigo e irmão Padre Mário de Oliveira. Foi com grande alegria que mastiguei este livro, e como não podia deixar de ser, esta breve apresentação vai ter em conta também a minha experiência enquanto leitor dos livros mais recentes do Padre Mário, pois só assim se percebe e se interioriza a teologia profundamente libertadora que aqui é anunciada, e que está nos antípodas daquela que é praticada pelas religiões do poder. Devo dizer-vos que em minha opinião, dos mais de 40 livros que o Padre Mário publicou até hoje, este é porventura aquele que tem o título mais saudavelmente provocador e desafiador, e por isso será talvez o título mais vivo de todos. Não é nada fácil manter esta fasquia tão elevada, porque o Padre Mário costuma ser muito ousado na escolha dos títulos que dá às suas obras, mas a boa notícia, é que felizmente continua intacta esta sua capacidade de nos surpreender. “A Bíblia ou Jesus?”, já repararam na força extraordinária deste título? Não é a bíblia e Jesus, nem muito menos a Bíblia e/ou Jesus. O livro impele-nos a escolher um de dois caminhos. Ou o da bíblia ou o de Jesus. E esta é a revelação teológica mais profunda contida neste livro. Ou seja, os dois caminhos são antagónicos e por isso incompatíveis. Não significa isto que se deva rasgar e queimar a bíblia. Ela deve ser vista como uma biblioteca para nós estudarmos, mas nunca para a praticarmos. Por outro lado deve servir essencialmente para nos defendermos desta ideologia e teologia do poder que atravessa todos os seus livros, e que por isso nos explora e corrói as entranhas. É muito importante salientar esta mensagem porque a bíblia e também o Alcorão podem ser armas tão ou mais mortíferas do que as armas convencionais. Se é verdade que as armas bélicas podem matar o corpo, mas jamais podem matar a consciência, enquanto os livros sagrados têm sido utilizados e manipulados ao longo destes 2 milénios pelas cúpulas e biblistas institucionais das várias facções, seitas e igrejas só para matar a identidade de cada um de nós. Este eu sou que nos torna únicos e irrepetíveis. Reparemos que o próprio Jesus prefere sacrificar a própria vida à sua identidade, pois foi pelo facto de ele se ter mantido sempre fiel aos seus princípios que acabou por ser assassinado na cruz do império. Na coerência dessa postura Jesus é o primeiro a demarcar-se da bíblia desafiando por exemplo o sábado sagrado, que é no fundo o resumo de toda a bíblia. Ou seja, Jesus, que era judeu, acaba paradoxalmente por ser o primeiro a romper com o judaísmo e com a Bíblia. Neste livro o Padre Mário faz muito bem esta diferença entre por um lado o Cristo que é anunciado na bíblia como o poder invicto, por isso mítico e fora do humano, e por outro lado Jesus, o ser humano pleno e integral, a referência máxima para todos nós seres humanos. Neste sentido o autor tem a ousadia de dizer neste livro que Jesus estará morto enquanto durar a bíblia judaico-cristã, o que digo eu, é a maior tragédia para a nossa humanidade. A meu ver a mensagem mais arrebatadora e ao mesmo tempo mais libertadora que podemos encontrar nesta obra, é a denúncia e consequente desmistificação de um Deus poder, de um povo eleito, desta dicotomia em que de um lado estão os vencedores e do outro lado os vencidos. E esta denúncia pode, numa primeira fase doer muito, porque abala toda a teologia em que muitos de nós fomos educados, mas uma vez acolhida, é profundamente libertadora, porque esclarece muitas das questões que em surdina íamos fazendo interiormente, e para as quais nunca encontrávamos uma resposta aceitável e intelectualmente honesta. Porque é que muita linguagem da bíblia chega a ser tão dura e violenta? Porque é que há sempre uma preferência por um povo em detrimento de outros? São respostas que podem ser encontradas na Bíblia ou Jesus?, que denuncia de forma clara duas perversões. Uma delas é que as religiões têm usado os livros sagrados para se perpetuarem na história. A outra é que inicialmente esta linguagem bíblica foi concebida à medida dos anseios de poder e de domínio das populações, por parte da casa real de David, que quase se equipara a Deus e tenta fazer com que a humanidade creia que essa casa real foi ungida por Deus para mandar em todo o mundo e explorar todos os povos, como se fosse possível existir um Deus assim criado à medida de tão perversa e desmedida ambição. Reparemos a este respeito que Jesus só é posto a nascer em Belém, porque foi a cidade atribuída ao nascimento de David. Jesus nasceu efectivamente em Nazaré. Reparem que o próprio mito da criação das origens, o de Adão e Eva, que o Padre Mário já desmontou de forma fundamentada em 2000 no livro “Nem Adão e Eva nem pecado original” é o exemplo acabado de um mito criado para legitimar a casa de David-Salomão. Como se isso já não bastasse, este mito é a principal justificação para o machismo que ainda hoje impera na nossa humanidade, um mundo sem espaço para o feminino e para a liberdade, em que a bíblia tem o descaramento de nos apresentar a mulher como propriedade do macho, a principal fonte de pecado e a tentadora do homem, em que até as suas naturais dores de parto são um castigo pelo facto de ela ser a principal culpada pelo mal que há no mundo, fruto da patética invenção e concepção do pecado original em que todos, todas nascemos. Urge portanto acolher a denúncia presente neste livro, segundo a qual os vencedores usam a sua religião para seu proveito, e os vencidos que já de si são tão humilhados e explorados, para cúmulo ainda são incitados a adorar o Deus dos poderosos. Esse Deus que abençoa e justifica todas as atrocidades que são feitas contra as populações, sobre tudo esta tentativa de não as deixarem ser autónomas, livres, responsáveis, donas dos seus destinos, criadoras e construtoras da humanidade. Dá a ideia que as populações têm de viver sempre debaixo da alçada do Deus anunciado pela bíblia que, para cúmulo, religa apenas os membros de determinada ideologia, fazendo crer que só somos verdadeiramente irmãos se fizermos parte da mesma religião ou seita. Um Deus assim, a existir, seria altamente injusto e desumano. Em contraponto, é imperioso que resgatemos a bíblia dessa ideologia do poder e fiquemos com Jesus, o ser humano e integral, e que prefere sempre as vítimas em vez dos poderosos, e que está empenhado em combater até ao sangue a pacífica existência da pobreza estrutural e de pobres em massa. É preciso anunciar alto e bom som que nós não somos filhos das religiões, mas sim seres humanos. Por isso o padre Mário não tem dúvida em dizer que devem desaparecer os 3 poderes, pois não precisamos de messias-cristo, de um redentor/salvador da humanidade. Temos de nos descobrir tais quais somos, e permanecer-mos maieuticamente religados uns aos outros, como se Deus nem existisse, numa postura de vasos comunicantes consciência, segundo o princípio humano, de cada um segundo as suas capacidades, a cada um segundo as suas necessidades. No início desta apresentação, eu falei da saudável provocação do título do livro. Mas ao analisarmos também os títulos dos 14 capítulos, verificamos que alguns têm uma força absolutamente extraordinária. Vejamos por exemplo: Capítulo 3. “TESTEMUNHAS DE JEOVÁ, O TERROR FEITO DEUS”; Capítulo 5. “JESUS ROMPE COM O JUDAÍSMO E COM A BÍBLIA”; Capítulo 9. “O LIVRO DOS SALMOS, O MAIS NOCIVO DA BÍBLIA?” Um título inquietante sobre um dos livros mais utilizados nas celebrações da igreja católica. Capítulo 10. “DA BÍBLIA, NEM OS PROFETAS SE APROVEITAM!” Capítulo 11. “NEM ADÃO E EVA, NEM PECADO ORIGINAL”; e o último capítulo do livro, o 14. “E DEUS OS FEZ HETEROSSEXUAIS E LGBT”, é um capítulo de leitura obrigatória porque a bíblia, lida assim de forma literal, é altamente homofóbica. E essa é uma grande razão para que nos interroguemos sobre a justiça de um Deus assim tão discriminatório. Como tal, a última mensagem que vos deixo foi colhida deste livro, (capítulo 14, versículo 12), e diz-nos que “desistir da Bíblia é preciso. São livros datados, parados no tempo. Inimigos dos seres humanos-consciência ainda em vias de nos fazermos, num universo, também ele, ainda em expansão”. Braga, Auditório da Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva 07 de Julho de 2017.

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