sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

A degradação do estado de direito protagonizada pelo movimento que se lixe a troika

Os cristãos sabem que um dos 10 mandamentos é não evocar o santo nome de Deus em vão. Não sei se os senhores do movimento que se lixe a troika são ou não cristãos. Para o caso nem interessa, mas infelizmente eles evocaram Grândola em vão, e pior do que isso, deram uma má imagem da nossa democracia, e ao contrário daquilo que possivelmente seriam as suas intenções, até fizeram um grande favor ao primeiro-ministro, porque deram azo a que a opinião pública gaste tempo a discutir esta atitude parva, desviando assim o foco dos principais problemas do país. Sei que muitos amigos meus, poderão ter ficado com um sorriso atrás da orelha ao verem o primeiro-ministro a ser interrompido pelo Grândola vila Morena. Mas para quem como eu que mesmo perante estas dificuldades todas e o descrédito, muitas vezes perfeitamente justificado que a classe política tem na sociedade civil, entende que vivemos, ou pelo menos devemos viver num estado de direito, não pode pactuar com este tipo de posturas mediáticas, que depois, e aqui é que reside o busílis do problema, levam inevitavelmente a um discurso absolutamente demagógico. E isto porque Evocar Grândola cada vez que se discute a crise é desvirtuar por completo do contexto não só do hino em si, como das próprias formas de luta, que na altura foram fundamentais para se conseguir viver em liberdade. E viver em liberdade é precisamente respeitar as instituições, a vontade do povo e da maioria. Liberdade não é eu impingir a minha opinião, ou tentar de certa forma inverter o estado de direito. Isso chama-se anarquia, o que é bem diferente. E depois, vemos estes exageros e comparações que de tão estúpidos até se tornam cómicos, como por exemplo o de comparar o nível de vida que os portugueses têm hoje, com o que tinham por alturas de 1974. É preciso percebermos que como acontece com muita coisa, ao exagerarmos acabamos por cair no ridículo. E se alguns estudos nos dizem que Portugal hoje voltou ao nível de vida de 2004, não é propriamente voltar ao nível de vida de 1974! Há que por as coisas nos seus lugares, e perceber que afinal o mundo não acabou, e que há verdades que embora polémicas são indesmentíveis e têm de ser ditas a bem da nossa sanidade mental. Quando se fala nos portugueses que ultimamente têm emigrado, não nos devemos esquecer que Portugal sempre foi um país de emigração, e isso só deixou de ser evidente num período de vacas gordas, o mesmo é dizer, naquela altura onde fomos inundados de fundos comunitários. E o problema é precisamente este. Portugal esteve em pré banca rota em 1978, depois voltou a estar em 1983, e apenas conseguiu aguentar até 2011, não por mérito das nossas políticas, mas sim por causa do dinheiro que veio da União Europeia. E quando esses senhores do que se lixe a troika, e outros mais saudosistas e radicais que gostam de evocar os ideais de Abril para tudo, cantam o Grândola, e defendem que estão a ser postos em causa os valores de Abril, deviam pensar nisto. Portugal desde o 25 de Abril esteve 3 vezes quase a atingir a falência, e viveu durante muitos anos num desafogo virtual. Virtual porque não era fruto da riqueza que produzíamos, mas sim do dinheiro que Alemães, Franceses e ingleses nos davam. Precisamente estes que nós agora odiamos. Vejam só como as coisas são! E aquilo que eu gostava era que Portugal deixasse de ser um dos parentes pobres da Europa, e que de uma vez por todas fizéssemos o que temos de fazer para nos tornarmos verdadeiramente competitivos, positivos e matássemos aquela imagem do país derrotista que nos tem apoquentado à tempo de mais. E este desidrato deve ser de todos, desde a esquerda à direita. Porque se por um lado não podemos permitir que o país continue com esta carga fiscal absolutamente insuportável, mas também não podemos ficar por esta análise simplista de acharmos que a solução é num ápice devolvermos os subsídios à função pública, diminuir a carga fiscal, aumentar o salário mínimo, aumentar todas as pensões etc. Sabemos que infelizmente a nossa realidade é complexa, e por mais que os movimentos recém criados entuem o Grândola ou outra música de intervenção, que eu gosto bastante, não vão conseguir mudar a realidade. E a realidade diz-nos que Portugal tem um produto interno bruto muito baixo, que por isso se precisa de financiar no estrangeiro, e que para isso é preciso inspirar confiança, porque caso contrário obviamente ninguém nos vai emprestar dinheiro se souber que há grandes probabilidades de não pagarmos a tempo e horas as nossas obrigações. Querer mitigar a realidade com este tipo de atitudes, é prestar muito mau serviço ao país, e descredibilizar a razão que muitas vezes as oposições têm, porque naturalmente muita coisa de mal tem sido feita, e uma oposição séria, concreta, objectiva, focada no essencial, mas sobre tudo uma oposição alternativa coisa que não tem acontecido, é muito importante. Agora, também me permito dizer com toda a frontalidade que este governo tem razão em muitas das políticas e medidas que tem adoptado. E dou apenas um exemplo concreto. Será justo que uma pessoa se reforme aos 50 anos com 3000 euros de reforma? Eu sei que essa pessoa não roubou nada a ninguém. Mas pensemos um bocadinho. Será que é honesto dizer-se que ela tem direito a essa benesse? E agora, só porque governos anteriores adoptaram uma gestão muitas vezes criminosa e permitem estas loucuras, vamos continuar com isto indefinidamente, persistindo no erro? E com que carga de água eu que trabalho tenho de pagar para essas pessoas? E porque é que eu não tenho o direito em me reformar aos 50 anos com uma pensão assim tão simpática como a deles? Em suma, acham errado atacar este problema? É que o problema do país é o excessivo corporativismo. Se o governo vem com uma medida sobre os professores, lá estão eles todos em filinha a reclamar. Mudanças, não?? Mudem tudo menos a minha quinta. Se vier uma medida relacionada com os médicos, lá vêm eles também a refilar. Podem mudar em tudo, agora aqui não! Será justo continuarmos com vários países. Por exemplo a função pública e os outros? E será que também não é inconstitucional uns terem 30 dias de férias, e outros que só porque trabalham no privado apenas têm 22? Assim, é muito difícil o país ir para a frente. E eu fico muito triste porque gostava de ver um debate abrangente, onde isto fosse discutido aberta e frontalmente. Mas parece que ninguém está interessado. Eu sei que provavelmente Se adoptarmos e continuarmos com a postura que hoje tiveram os manifestantes, podemos espernear, berrar, e até podemos dizer que os governantes são todos ladrões. A questão é que infelizmente o mundo não se compadece com faltas de profissionalismo, de rigor e competitividade. E se enchemos a boca para dizer que vivemos num período de globalização, então à que dizer que para o bem e para o mal, estamos todos inseridos na mesma comunidade, e temos de cumprir com as mesmas regras. É verdade que até podem dizer que isto é uma posição ideológica. Admito isso, e até defendo que tudo na vida que fazemos, dizemos e pensamos assenta numa base ideológica, quanto mais não seja, a nossa própria ideologia que vamos construindo ao longo dos anos. E por isso, dentro daquilo que é a minha sensibilidade, não gosto deste tipo de manifestações como a que tivemos hoje, também não defendo a generalização que muitos fazem da nossa classe política, também acho que objectivamente ninguém adopta a austeridade por prazer, e acho ainda que para se crescer não basta encher a boca com a ideia segundo a qual o remédio para tudo é o crescimento! Bingo, isso todos nós já sabemos. No entanto, para o cidadão comum, que vê realizarem-se grandes conferências, congressos e reuniões, e depois como conclusão chave ouvem dizer que o que Portugal precisa é de crescer, acaba por ser um insulto à inteligência das pessoas. Crescer como? Diminuir os impostos como? De que forma me convencem que quando uma família está endividada, pode reestruturar a sua vida e pagar as dívidas gastando o mesmo ou até mais? É que a ideia que temos ouvido ser defendida, e que isto só se resolve baixando o iva, incentivando o consumo. E por isso eu pergunto. Se eu estiver endividado, será que posso continuar a ter as despesas que tinha anteriormente? Não insultem a inteligência das pessoas por favor!

Sem comentários: